Por
Antonio Gesteira
Ao longo dos últimos 20 anos vivemos
momentos de crise que impactaram de forma significativa a rotina de populações
ao redor do mundo, como o ataque terrorista às torres gêmeas no início do novo
milênio, o estouro da bolha imobiliária americana e, agora, a pandemia global
provocada pelo novo vírus.
Quando analisamos os impactos das crises
sobre as organizações, podemos observar que eventos não planejados, como os
mencionados acima, afetam de forma significativa a continuidade e a
sobrevivência das companhias em escala global. Alguns outros fatores, como
erros, omissões, falhas nos controles internos, fraudes ou desvios de conduta
de natureza interna e/ou externa, também aumentam a exposição das empresas,
além de ocasionarem perdas financeiras ou danos de imagem.
O desafio que encontramos ao conduzirmos
investigações empresariais em tempos de crises, sobretudo agora durante a
pandemia provocada pela Covid-19, está associado a um conjunto de fatores que
precisam ser ajustados, pois há restrições nos deslocamentos por parte da
equipe, as entrevistas exploratórias ocorrem de forma não presencial, as
interações multidisciplinares com os especialistas se tornam menos frequentes e
a apresentação de resultados podem gerar dúvidas e esclarecimentos adicionais.
Se por um lado notamos um aumento no
número de investigações em eventos de crise, por outro precisamos repensar a
forma de conduzirmos o processo de apuração, considerando as novas tecnologias
e técnicas na era do Forensic 4.0. No modelo tradicional, a condução de um
processo investigativo considera a realização de atividades de planejamento,
identificação dos alvos, entrevistas, coleta, processamento, triagem e análise
de dados, produção e apresentação de resultados.
Na abordagem do Forensic 4.0 é reunido
um conjunto de técnicas e ferramentas que, quando aplicadas de forma integrada,
reduzem o número de falso negativos ou falso positivos, bem como gera uma base
de conhecimento que pode ser aplicada em outros eventos similares. Dentre as
principais funcionalidades incorporadas nesta metodologia, podemos elencar
alguns elementos que se destacam e merecem a nossa atenção, como a utilização
de modelos baseados em casos de uso, a recuperação de arquivos deletados, a
transcrição de áudio e reconhecimento facial, o uso de inteligência artificial
e do Machine Learning, assim como a criação da base de conhecimento e perfil de
risco.
É importante destacar que algumas das
técnicas e ferramentas descritas acima já estão disponíveis e podem ser
utilizadas. Alguns exemplos de casos de uso aplicáveis que merecem destaque,
sobretudo em momentos de crises, podem ser utilizadas em situações como roubo
de identidades e compras não reconhecidas no e-commerce, transações bancárias
fraudulentas e lavagem de dinheiro, apuração de vazamento de dados e roubo de
propriedade intelectual, operações de M&A e disputas judiciais e
extrajudiciais, além de crimes contra a ordem tributária e investigação de
denúncias de assédio moral, sexual, fraudes e corrupção.
Em todos os casos mencionados acima, a
complexidade da investigação pode ser maior ou menor, dependendo da magnitude e
relevância de cada caso. O que deve ser comum entre todos eles é que o objetivo
central de toda a investigação é buscar respostas objetivas para as seguintes
perguntas: o que aconteceu, quando aconteceu, como aconteceu, quem é o
responsável e se possível quanto foi desviado da companhia.
Adicionalmente, devemos flexibilizar as
técnicas aplicadas durante a investigação diante do “novo normal”, mas para
isso é importante refletirmos sobre como atuamos no passado, o que funciona ou
não no presente e como nos prepararmos para lidar com as novas tecnologias,
considerando nosso novo ambiente de trabalho remoto e operações
descentralizadas.
Antonio
Gesteira é líder da prática de Forensic 4.0 da ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos,
compliance, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados.