Investigações corporativas: riscos pela falta de mão de obra e oportunidades com os serviços profissionais
por Bruno Massard*
Apesar de ainda
surpreender muitos executivos que não estão ligados diretamente ao mundo do
compliance e das investigações, não é novidade (para os que estão) que 5% da
receita bruta das empresas são perdidas em algum tipo de fraude, de acordo com
a pesquisa da ACFE (Association of Certified Fraud Examiners), maior
instituição mundial de estudos sobre fraudes ocupacionais.
A importância
desse número é ainda mais relevante nas empresas que operam com margens de
lucro próxima a esse percentual. Essa estatística, associada à prática de
compliance, tem convencido muitas empresas de que o desenvolvimento de
programas efetivos e o investimento na ética e na integridade deixaram de ser,
como diriam os americanos, nice to have e se tornaram must have.
No entanto, ao
passo que os programas efetivos são assets para as companhias, programas
não efetivos trazem riscos que podem ter o efeito exatamente contrário: por
exemplo, mostrar que a alta administração não está, de fato, comprometida com
essas boas práticas.
Também é fato
que os departamentos de compliance e investigações passaram por uma ampliação
no mercado, especialmente a partir da promulgação da Lei Anticorrupção
brasileira, sendo ainda mais catalisados a partir das operações Lava Jato,
Greenfield e outros movimentos que passaram a demandar das empresas
profissionais para planejar, implementar e monitorar atividades suspeitas
e relacionadas a ética.
Neste cenário,
começa a se desenhar um dos riscos significativos para as companhias: a falta
de mão de obra qualificada que, naturalmente, acaba por acelerar carreiras de
profissionais que ainda precisariam de mais estrada para uma posição tão relevante.
É importante destacar que, ao contrário do que muitos pensam, liderar uma
prática de compliance vai muito além de estabelecer o tom da liderança, mapear
riscos, desenhar políticas, procedimentos, treinamentos e comunicações. O
profissional de compliance vive no caos, buscando mitigações de riscos,
estabelecendo processos e tratando conflitos diversos - inclusive de interesses
- de forma que a companhia consiga operar, fazer negócios e crescer, sempre
dentro da linha ética.
Esses desafios
não são diferentes para o mundo das investigações corporativas. Os
profissionais efetivamente treinados e capacitados para investigações -
especialmente as mais complexas, com necessidade de judicialização e, ou, mesmo
com impactos financeiros e contábeis relevantes, ainda são raridade no mercado.
E, assim, parece que o risco se torna ainda maior.
Isso porque as
investigações internas não estão associadas apenas a aspectos financeiros ou
comportamentais. É importante entender que toda investigação, em tese, possui um
ou mais targets e, esse alvo, é um ser humano. E, por trás desse, há uma
família. Uma apuração superficial ou mal executada pode levar a conclusões
equivocadas que acabam com a vida profissional de um executivo ou colaborador
e, consequentemente, impacta a vida de "n" outras pessoas: sua
família.
Ainda assim, se
o desejo for olhar pelo lado financeiro, uma investigação mal executada pode
não atingir seus objetivos e, portanto, causar prejuízos à companhia ou,
ainda pior, gerar processos judiciais que obrigam a companhia a pagar
indenizações estratosféricas - muitas vezes a fraudadores que se valem de erros
operacionais para anular acusações e ainda “levar um a mais” por meio de danos
morais e materiais, sem contar quando não conseguem decisão judicial que o
reintegra ao quadro da companhia.
Não é raro ver
companhias que, ainda que com desejo de judicializar determinados casos, julgam
a terceirização da investigação como um processo caro e burocrático, optando
então pela condução interna da investigação. Na maioria das vezes, esse tipo de
escolha não respeita as melhores práticas de coleta e aquisição de evidências
que, por consequência, tornam eventuais provas inválidas para uso em
juízo. E, o surpreendente, é que por vezes essas decisões são tomadas de boa-fé,
sem se conhecer os reais riscos associados.
É nesse cenário
que usualmente sugiro que executivos em posições de alta direção
tenham em seu networking profissionais de compliance e forense
independentes, que possam fazer o papel de trusted advisors, indicando
caminhos eficientes e seguros - especialmente em situações e investigações mais
sensíveis de forma que, os riscos sejam mitigados e transformados em
oportunidades - nos quais a empresa se mostre ética e responsável, de
forma que perdas potenciais sejam convertidas em margem de lucro e,
consequentemente, em caixa. É fato que, uma investigação sem uso de
tecnologia e ritos apropriados, provavelmente não terá a abrangência
necessária, resultados esperados e assim, por vezes, poderá trazer mais riscos que
oportunidades.
*Bruno
Massard é diretor-executivo de Investigações e Auditoria Interna da ICTS
Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance,
ESG, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de
dados. Atua ainda como presidente do Capítulo Brasileiro da ACFE
(Association of Certified Fraud Examiners), é coordenador da pós-graduação de
Compliance do IBMEC-RJ e professor convidado do LLM de Compliance da FGV.