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por André Ferreira
Nos últimos anos
houve um aumento considerável, principalmente no estado do Rio de Janeiro, do
número de casos em que empresas prestadoras de serviços de telecomunicações são
impedidas de acessar algumas regiões, comumente dentro de comunidades
controladas pelo tráfico de drogas ou pela milícia. Recentemente, uma grande
empresa do setor divulgou, em webinar sobre segurança e integridade de
infraestruturas de rede, no painel Telebrasil, que seus colaboradores estão
impedidos de acessar 105 comunidades na região metropolitana.
Para entender
melhor de que forma chegamos a esse ponto, é preciso mencionar a evolução das
organizações criminosas nas comunidades do Rio de Janeiro. As milícias controladoras
de regiões e que possuíam um discurso de combate ao crime e geração de receitas
que vinham exclusivamente de valores arrecadados junto a moradores e
comerciantes locais em troca de uma suposta segurança, agora enxergaram também
um grande potencial econômico na exploração de serviços, como TV a cabo e
internet, além do fornecimento de produtos essenciais para a população local,
como botijões de gás e galões de água mineral.
Já as
comunidades controladas por facções criminosas tinham sua receita oriunda,
quase que totalmente, do tráfico de drogas, mas com a expansão do controle de
grupos milicianos em várias regiões do estado, iniciou-se um movimento de
intercambialidade de práticas criminosas. Atualmente, nessas comunidades também
ocorre a exploração de produtos e serviços, prática anteriormente exclusiva de
grupos milicianos. Em contrapartida, nas comunidades controladas por grupos
milicianos agora é comum também o tráfico de drogas. Toda essa evolução nos
traz ao cenário atual de consolidação de grupos narcomilicianos atuando nas
comunidades do Rio de Janeiro.
Quando
analisamos os serviços de internet e TV por assinatura oferecidos de maneira
desleal nas comunidades, os provedores clandestinos vão angariando clientes
nesses locais com o aval de grupos criminosos que controlam as comunidades e
coagem a população a contratarem os serviços somente de empresas indicadas.
Neste cenário ocorre a sabotagem e até mesmo o sequestro de estruturas de rede
implantadas por empresas autorizadas pela Anatel para a exploração desses
serviços, que passam a operar em favor dos provedores clandestinos. Além disso,
comumente, técnicos das grandes empresas são ameaçados e proibidos de entrarem
nas comunidades, sob pena de represálias.
Para termos uma
ideia da amplitude desse problema, num estudo conjunto realizado por diferentes
órgãos, como o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal
Fluminense (GENI/UFF), o Datalab Fogo Cruzado, o Núcleo de Estudos da Violência
da USP, a Plataforma Digital Pista News e o Disque-Denúncia, até o ano 2019,
aproximadamente 57,5% do território da cidade do Rio de Janeiro estava dominado
por grupos milicianos, enquanto outros 34,2% são controlados por pelo menos uma
das três principais facções criminosas da cidade. A conclusão é que quase 4
milhões de cariocas vivem em regiões controladas por grupos criminosos.
Com este
histórico, é possível entender o tamanho do desafio apresentado para o estado,
responsável em prover a segurança necessária para a garantia da distribuição
dos serviços essenciais, como os oferecidos pelas empresas de telecomunicações.
Tão grande, se não maior, são os desafios que enfrentam as empresas do setor de
telecomunicações, pois sem políticas públicas de segurança que gerem resultados
efetivos, cabe a elas trabalharem o tema internamente para minimizarem suas
perdas.
Para que as
empresas de telecomunicações consigam mitigar os riscos envolvidos na
exploração de seus serviços em todas as regiões, como as comunidades do Rio de
Janeiro, é necessário o desenvolvimento de algumas ações em três grandes
frentes de segurança operacional.
Primeiramente, é
importante desenvolver atividades de inteligência, em conjunto com a segurança
pública, para que sejam levantadas informações nas regiões de maior
complexidade, e haja atuação no combate a provedores clandestinos,
inviabilizando a exploração desse tipo de atividade.
Em conjunto com
as atividades de inteligência, é importante a aplicação de agentes de campo
para a coleta dessas informações, as apurações e o acompanhamento de
ocorrências, além da realização de estudos no campo de gerenciamento de riscos
para ampliação da rede das empresas de maneira estruturada no quesito segurança
corporativa.
Por fim, é de
extrema importância o uso de tecnologias que venham a mitigar os riscos
envolvidos sobre o patrimônio das empresas de telecomunicações e, nesse caso,
tratamos sobre toda infraestrutura de rede necessária para que os serviços
dessas empresas cheguem à população.
A aplicação do
conceito de segurança exponencial, com o uso de tecnologias que atendam às
exigências de segurança de informações, proteção de dados e compliance,
associados à alocação otimizada de recursos para potencialização das ações de
inteligência e segurança integradas do negócio, compõem o caminho para que
empresas de telecomunicações possuam operações mais controladas e com menores
riscos de ocorrências que impactem a prestação dos seus serviços nesses locais.
*André Ferreira é consultor sênior de segurança empresarial na ICTS Security, empresa de origem israelense que atua com consultoria e gerenciamento de operações em segurança.