Por Daniel Domeneghetti
O círculo virtuoso da
transformação das empresas para a sustentabilidade demanda um roteiro de
atitudes assumidas por seu principal líder (CEO, presidente, dono) que estão
ligadas ao estabelecimento claro de um senso de urgência em torno do tema e seu
impacto com os negócios das empresas. No final do dia, o que está na mesa é
garantir às empresas as chamadas licenças para operar, tanto as formais (ex.
licenças governamentais ligadas à exploração de áreas relevantes nas questões
ambientais), como as informais (as licenças sociais “outorgadas” pelas
comunidades e mercados de atuação da empresa, pelos clientes, pelas redes
sociais, dentre outros).
Líderes devem liderar,
formular a visão, compartilhar essa nova visão e capacitar outros atores para
que ajam de acordo com a nova visão.
Cabe ao principal líder da
empresa, contaminar positivamente todas as instâncias hierárquicas da empresa. Em
geral, criar uma diretoria de meio-ambiente ou de sustentabilidade, como se
fosse um centro temático isolado, não vai funcionar.
No fundo, não se trata
de quanto deve ser investido por cada empresa, 1% do lucro pode ser muito ou
pouco. A aferição se o percentual é ou não suficiente, se é razoável ou não,
deve estar baseada nos resultados e, principalmente, no setor e cadeias de
atuação da empresa e no seu perfil de impactos operacionais e stakeholders
envolvidos.
Com qualquer investimento,
o payoff aparece com resultados práticos, tangíveis e/ou intangíveis. Se houver
mudanças positivas das dimensões social e ambiental pelo menos regionalmente,
sua aplicação foi positiva, independentemente do percentual, porque a derivada
econômica se beneficia de ambas. Se uma empresa aplica 1% do seu lucro em
educação ambiental, mas se esse investimento não produzir resultados, ele se
torna inócuo.
Obviamente, alguns
mercados e segmentos são potencialmente mais agressivos ao meio-ambiente (como
papel e celulose, petroquímico, siderúrgico, dentre outros). Outros carregam o
fardo de serem potencialmente mais impactantes à sociedade, como farmacêutico,
saúde, educação e financeiro. E é claro quanto mais potencialmente agressivos e
relevantes forem ao meio-ambiente e à sociedade, mais sujeitos a monitorias,
fiscalizações, pressões, regulamentações e legislações contrárias a estes
riscos estarão, sejam estas do Governo, de ONGs, de Sindicatos, de Associações
Setoriais, da Mídia ou do Consumidor-Cidadão.
Os grandes holofotes
devem estar voltados à criação de novas lideranças, aos líderes em
sustentabilidade. Foi
com esse intuito também que nasceu um projeto apoiado pela ONU para criar, em
todo o mundo, até 2015, um milhão de líderes globalmente responsáveis. O
relatório produzido pelo grupo aponta os quatro principais desafios dos novos
líderes: “Primeiro, eles devem pensar e agir em um contexto global. Em segundo
lugar, devem ampliar seu propósito corporativo para que reflita sua prestação
de contas para a sociedade do mundo inteiro. Em terceiro, devem colocar a ética
no centro de seus pensamentos, palavras e ações. Em quarto, eles – e todas as
escolas de negócio e centros de educação para a liderança – devem transformar a
educação de executivos para dar à responsabilidade corporativa global a
centralidade que ela merece”.
Desta forma, consegue-se
envolver as instituições de ensino na tarefa de fomentar o desenvolvimento de
líderes empresariais cuja atuação vá além das regulamentações internacionais,
legislações locais, enfim, mudar os currículos tradicionais de escolas e
universidades.Líderes tomadores de decisão, capazes de projetar cenários que
antecipem um futuro provável, tanto pela dimensão econômica, como social e
ambiental devem ser potencializados imediatamente. Aqui está o senso de
urgência da sustentabilidade.
A perspectiva empresarial
tradicional restringe o escopo de análise de risco a fatores locais que ameaçam
a integridade dos ativos corporativos mais tangíveis, tais como mão de obra,
estoques e equipamentos essenciais ao processo produtivo, gravitando em áreas
como saúde e segurança ou ainda na forma tradicional de incêndios e enchentes que
podem danificar a infraestrutura da empresa e seu entorno.
No contexto da
sustentabilidade, essa visão tradicional deve ser ampliada para os mega riscos.
Os mega riscos estão no campo da intangibilidade e/ou das tendências de médio
longo prazo, sejam eles locais ou globais, e apresentam-se de muitas formas,
como instabilidade política social, proteção da marca e reputação, sabotagem,
pandemias, terrorismo, corrupção, aquecimento global, escassez de água,
mudanças climáticas, dentre outras.
As características de
causa e efeito dos megarriscos são holísticas, sistêmicas e de longo prazo. Em
tese, todos nós deveríamos, como empresários, executivos, trabalhadores,
políticos, cidadãos e consumidores estar atentos a eles e trabalhar para
identificá-los, mitigá-los e controlá-los. Entretanto, esta tarefa é ainda
inglória, pois faltam líderes e políticas de consenso amplamente adotadas pelos
diversos players e partes interessadas em cada tema-ameaça da sustentabilidade,
seja social, seja ambiental.
Dentre estes consensos,
estão questões como o Protocolo de Kyoto, as Metas do Milênio e os Princípios
do Equador, que deveriam ser amplamente adotados por todos, o que não tem
ocorrido.
Isso se explica porque, em
parte, porque o ser humano não foi treinado antropologicamente para prestar
atenção aos riscos de médio e longo prazo, porque são teoricamente pouco
materiais. Entretanto, enfrentá-los é preciso.
A
agenda para “erradicá-los” coincide com a agenda da sustentabilidade, devendo
estar conectada à indução de uma boa e transparente articulação no mundo
tripolar (empresas, governos e sociedade civil organizada), valorizando sempre
o diálogo com os principais stakeholders envolvidos por responsabilidade
(ativamente) ou por impacto (passivamente). O resto da receita deve incluir o
pensar no impensável, procurando sempre a antecipação para mudar os cenários de
risco. Tarefa difícil, para poucos líderes. Mas desde quando salvar o mundo é
missão trivial?