Febre Amarela: o que a gestão de operações pode aprender com o surto?


Por Victor Tubino

Longas filas madrugada a dentro e senhas insuficientes são algumas das realidades atravessadas pela população para tomar a vacina da febre amarela. Porém, há outras realidades trazidas pelo vírus que não estão intimamente ligadas ao surto, mas que podem causar estragos para uma ala importante da sociedade: as empresas.  Sob o prisma corporativo, do profissional que atua na área de gestão de operações, a consequência de todo este caos nada mais é do que um desequilíbrio mercadológico.
Fazendo uma pequena analogia cíclica, enquanto a população/consumidor exige a disponibilidade das vacinas/ produtos nos postos, o governo - a empresa neste caso - tenta controlar os ânimos e busca atender as expectativas da população/consumidor.
Quando analisamos esta situação sob o aspecto de gestão de operações, as filas são o principal sintoma de problemas de capacidade para atendimento da demanda. Sob esta ótica, o aumento abrupto da demanda pela vacina e pelo serviço de vacinação da febre amarela afetou o equilíbrio entre as forças de oferta e demanda. E, como a cadeia de produção e distribuição de vacinas não consegue acompanhar este movimento, por haver diversas restrições para aumentar rapidamente a produção, a demanda não é atendida e o novo equilíbrio também não é atingido. 
Ao analisar a série histórica dos casos registrados de febre amarela no Brasil de 2010 a 2016, temos uma média de quatro casos por ano e, com base neste cenário, o Ministério da Saúde define as doses necessárias e acorda junto às empresas produtoras o planejamento de produção e a entrega destas doses com, pelo menos, um ano de antecedência. Como exemplo, dentro do Programa Nacional de Imunizações (PNI), que foi acordado junto com a Bio-Manguinhos, empresa do grupo Fiocruz, a produção foi de 60 milhões em 2017 e 48,7 milhões de doses da vacina em 2018.
A partir de 2017, os casos aumentaram, chegando a marca de 779 ocorrências no mês de junho, o que representou um aumento de 3.500% em relação à média dos anos anteriores. O aumento de casos de óbitos em decorrência da doença foi um fator fundamental para o crescimento da demanda da vacina para a sua prevenção.
Em contrapartida, pelo lado da oferta, o processo de produção e distribuição da vacina pode variar de quatro até 22 meses, conforme a disponibilidade de insumos e o planejamento de produção da empresa. Da mesma forma que a capacidade dos postos de saúde de realizar a vacinação é restrita em função do horário de atendimento e das equipes, que também tem que atender a demanda de outras vacinas no mesmo período.
Todo este cenário caótico serve para mostrar às empresas sobre a importância do equilíbrio de mercado, que, em essência, é quando as quantidades oferecidas são iguais às quantidades procuradas.
Pensando nisso, há cinco medidas, exemplificadas a partir do assunto febre amarela, que estão sendo adotadas pelo governo e que também podem ser adotadas pelas companhias para serem colocadas em práticas como forma de minimizar os efeitos do desequilíbrio mercadológico e de retomar a normalidade o mais rápido possível:

1.    Priorizar a demanda: Definir o público-alvo da imunização, considerando os critérios definidos, como áreas de risco e pessoas que irão viajar para áreas de risco.
2.    Aumentar a capacidade de atendimento: estender os horários e equipes de atendimento nos postos de saúde, bem como realizar mutirões de vacinação.
3.    Otimizar o estoque atual: utilizar as doses fracionadas para o atendimento de mais pessoas com a mesma quantidade de vacinas.
4.    Priorizar a produção atual: acordar junto aos produtores a priorização da produção para o mercado nacional em detrimento de outras localidades.
5.    Ampliar a capacidade de produção: contratar empresas para aumentar a capacidade de produção de vacinas no longo prazo.

Entender o contexto da mudança da demanda e, principalmente, conhecer sua capacidade de produção, as restrições da sua operação e da sua cadeia de abastecimento são habilidades fundamentais do gestor de operações para que este possa definir e executar as melhores estratégias para o seu negócio. Que todos esses gargalos referentes à febre amarela tragam às empresas a lição de sempre assegurar a harmonia entre os seus interesses, dos produtores, mas sem esquecer de atender um dos seus principais stakeholders: o consumidor.

*Victor Tubino é gerente de BPI (Business Performance Improvement) e Risk Management e líder da prática de Distribuição e Gestão de Estoques da Protiviti do Brasil, consultoria especializada em gestão de negócios, tecnologia, riscos e auditoria interna.