*Por Heloisa Macari
No mês em que a Lei Maria
da Penha completa 12 anos, o homicídio de mulheres torna-se pauta cada vez mais
presente nas discussões sobre a preservação da vida. Ainda que as organizações
não sejam diretamente responsáveis pela redução das estatísticas, todas podem
ter papel importante na conscientização geral e no resguardo de possíveis
vítimas.
Ainda que os casos de
violência contra a mulher tenham ganhado ótica jurisprudente, as estatísticas e
acontecimentos recentes demonstram que, mesmo com o amparo da lei criada para
proteger as mulheres vítimas de violência, elas seguem sendo as grandes vítimas
nas narrativas de violência e homicídio. No Brasil, são registrados mais de 600
casos de violência doméstica por dia. Toda semana, pelo menos 20 brasileiras
são mortas, vítimas de feminicídio.
São inúmeros os casos
divulgados pelas grandes mídias e tantos outros que não ganharam notoriedade. O
ano de 2018 foi marcado pelo assassinato de Marielle Franco e, mais
recentemente, pelo caso de Tatiane Spitzner, encontrada morta após cair da
sacada de seu apartamento, no Paraná.
Segundo o Atlas da
Violência, divulgado no segundo semestre de 2018, somente em 2016, 4.645
mulheres foram assassinadas no País – o que representa uma taxa de 4,5
homicídios para cada 100 mil brasileiras. Ainda de acordo com o Atlas da
Violência, em dez anos observou-se um aumento de 6,4% nos casos de homicídio de
mulheres.
Heloisa Macari |
Embora a questão pareça
distante do mundo corporativo, os dados sobre a violência doméstica também têm
impacto altamente negativo na economia. Segundo pesquisas da Universidade
Federal do Ceará e do Instituto Maria da Penha, as vítimas perdem, em média, 18
dias de trabalho ao ano apenas por consequência direta das agressões sofridas.
As consequências na carreira destas mulheres envolvem menor estabilidade, menos
tempo de permanência em seus cargos e, também, menor produtividade.
A comoção pública
manifestada frente aos acontecimentos dá sinais de que a violência contra a
mulher está deixando de ser naturalizada. Assim, se a legislação e as políticas
públicas ainda não mostram-se verdadeiramente eficazes no combate às violências
de gênero, encontrar alternativas para educar, difundir direitos e
conscientizar sobre a necessidade do aprimoramento dos mecanismos de
enfrentamento é medida crucial para contribuir com a preservação de vidas.
O
dever da iniciativa privada
Uma organização é composta
por pessoas. Assim, gêneros, classes sociais, crenças e vivências completamente
distintas se misturam, dando origem à realidade de cada colaborador. Ainda que
não haja responsabilidade direta, uma empresa pode tornar-se grande agente na
transformação pessoal de cada um através da disseminação de orientações e do
oferecimento de suporte, contribuindo positivamente não somente no ambiente de
trabalho como, também, nas questões vividas externamente, fora do espaço da
organização.
São poucas as empresas que
olham para o que acontece além das suas instalações, principalmente quando o
assunto refere-se à violência contra as mulheres. Porém, na contramão desta
realidade, grandes empresas referências em inclusão e diversidade já mostram-se
atentas ao tema e, assim, vêm criando estruturas internas de proteção à mulher.
As medidas desvendam cada vez mais qual o papel da iniciativa privada na
mitigação dos casos.
A principal preocupação
das companhias engajadas no combate à violência de gênero é a de que suas
colaboradoras sejam vítimas do feminicídio, tendo suas vidas interrompidas por
omissão de toda uma sociedade.
Sabe-se que algumas
empresas passam a contar com a terceirização
especializada de canais de denúncias para criar linhas de comunicação
internas voltadas para esses casos. Com o objetivo de estimular as mulheres na
manifestação de ocorrências pessoais, os canais garantem segurança e
integridade física e mental, apoiando, capacitando e fortalecendo as
colaboradoras.
Como medida complementar a
ser adotada pelas organizações, pode-se, também, considerar a implementação de
treinamentos direcionados a todo o público relacionado à empresa.
Às colaboradoras,
entendimento das leis que explicitam seus direitos e treinamentos de
comportamento preventivo são alternativas para disseminar um conhecimento que
pode servir como base no resguardo de suas integridades. Aos colaboradores,
esclarecimento sobre os dados estatísticos relacionados à violência contra a
mulher e ao feminicídio, além do estímulo para ações diárias que podem fazer a
diferença na redução dos casos contra as mulheres.
E a sua empresa, tem
olhado para as colaboradoras de modo a oferecer suporte que auxilia na
mitigação dos casos de violência contra a mulher? Como sua organização tem
feito o melhor papel social que pode fazer?
*Heloisa Macari é sócia-diretora da
área de compliance na consultoria global Protiviti e professora de ética e
compliance na Fundação Instituto de Administração (FIA).