Por Daniela
Aggio*
Inúmeras matérias
descreveram com detalhes o assassinato da vereadora Marielle Franco, ocorrido
em março de 2018, por meio de alguns elementos da investigação, que apontaram
os prováveis executores do homicídio.
Embora o caso corra em
segredo de justiça, as informações divulgadas apontam que a polícia chegou aos
suspeitos por meio de denúncias recebidas de informantes, análise das câmeras
de segurança, radares inteligentes, que mostraram o passo a passo do veículo
utilizado no crime e, principalmente, dados digitais coletados nos celulares
utilizados por um dos suspeitos.
Os caminhos percorridos na
investigação, assim como em outros crimes recentes de grande repercussão na
mídia, muitas vezes são semelhantes aos realizados em investigações nas
empresas corporativas.
Daniela Aggio |
No caso da Marielle,
conforme foi divulgado na mídia, as informações coletadas direcionaram a
investigação para os dois suspeitos. Assim como nas averiguações realizadas
pelo poder público, relatos de informantes são um importante veículo nas
investigações nas empresas. Inclusive é o que mostra um dado divulgado em 2018
na última edição do estudo Report to the Nations da ACFE (Association of
Certified Fraud Examinersde, apontando que 40% das fraudes corporativas são
identificadas por meio de denúncias.
Em diversos casos conduzidos
de investigação corporativa, já recebi relatos que contribuíram para o sucesso
da investigação. A exemplo, cito uma situação recente de um colaborador que
denunciou, de forma anônima, dois gestores que contrataram uma empresa de
tecnologia pelo período de 2 anos no valor de R$ 4 milhões.
As informações apontavam que
os gestores eram os verdadeiros donos da empresa, embora não estivessem no
contrato social. Além disso, o informante apresentou dados concretos como
datas, locais do real funcionamento da empresa e outras informações
fundamentais para a comprovação dos relatos.
As análises das câmeras de
segurança são muitas vezes outra peças-chave no entendimento da movimentação
dos colaboradores e de outras pessoas de interesse dentro da companhia. Da
mesma forma, na investigação do caso Marielle, foram imagens de câmeras que
permitiram que a polícia rastreasse o trajeto do veículo usado no crime.
É comum utilizar análise de
imagens para identificar acessos indevidos, veículos utilizados em desvios e
até mesmo uso e tráfico de entorpecentes dentro das empresas. Graças ao uso de
análises das imagens de câmeras, somadas às informações de controle de acessos,
foi identificado um grande esquema de fraude no sistema de ponto e horas extras
da empresa.
Trazendo este episódio para
o caso Marielle, as verificações realizadas nos celulares utilizados por um dos
prováveis assassinos, acrescida aos dados armazenadas na nuvem, foram cruciais
para o avanço das investigações porque trouxeram registros de diversas
pesquisas realizadas na internet sobre a rotina e endereços da vítima. Em
outras investigações, também amplamente divulgadas, como na operação Lava Jato,
diversas informações foram coletadas nos celulares utilizados pelos envolvidos
nos esquemas.
O aumento da utilização dos smartphones
no cotidiano das pessoas e a criação de novos aplicativos e recursos, que
permitem maior armazenamento de dados e informações nos dispositivos e em
nuvem, fazem com que a importância da análise de dados eletrônicos aumente nas
investigações.
No âmbito das averiguações
empresariais, quando os aparelhos são de propriedade da companhia, a análise
dos dados armazenados no dispositivo e informações sincronizadas em servidor da
empresa é amplamente utilizada e traz resultados na elucidação de diversos
casos.
No contexto atual é difícil
imaginar que um fraudador utilize ferramentas corporativas para cometer
irregularidades e deixar rastros de suas ações, no entanto, ao contrário do que
ocorre com as informações que as pessoas enviam, elas não controlam as
informações que recebem. Além disso, as ferramentas forenses, que permitem a
recuperação de dados apagados e histórico de navegação na internet, trazem
informações que os fraudadores acreditam que foram excluídas
permanentemente.
Embora o poder da polícia
atribuído ao ente público permita atuação mais ampla nas investigações
policiais, as ferramentas e mecanismos de averiguação utilizados para desvendar
os mais diversos crimes, como ocorre no caso de Marielle Franco, também são
utilizados em casos de investigações corporativas. Isso possibilitando às
empresas a identificação de fraudes e riscos aos quais estão sujeitas e,
consequentemente, diminui as perdas ligadas a desvios e ações de
má-fé.
*Daniela Aggio é advogada formada pelo
Mackenzie, pós-graduada em gestão de riscos e fraudes corporativas pela
FIA/USP. É professora de técnicas de entrevistas investigativas na
pós-graduação de compliance e gestão de riscos da FIA/USP. Atualmente é
diretora de forensic na Protiviti, consultoria global especializada em Gestão
de Riscos, Auditoria Interna, Compliance, Gestão da Ética, Prevenção à Fraude e
Gestão da Segurança.