Por Jefferson Kiyohara*
Recentemente,
tive a oportunidade de participar de um dos maiores eventos de Ética &
Compliance do mundo, promovido anualmente pela SCCE (Society of Corporate
Compliance & Ethics), nos EUA. É um ambiente incrível com milhares de
profissionais de compliance de diversas geografias, de praticamente todas as
indústrias e com os mais variados níveis de experiência. Havia, por exemplo,
profissionais com menos de três anos de experiência em compliance e outros com
mais de 20 anos.
Oficialmente,
foi anunciada a participação de 25 brasileiros. Contudo, deveria ter
adicionalmente pelo menos a mesma quantidade, que mora e trabalha nos EUA, mas
que não apareceram nos indicadores oficiais no primeiro número em razão do
critério utilizado. Interessante perceber que temos brasileiros gerenciando
globalmente e regionalmente programas de compliance de grandes empresas,
atuando fora do Brasil e com o devido reconhecimento.
Vale destacar
também que a comitiva brasileira demonstra movimento crescente na busca pelo
conhecimento e pela troca de experiências, itens fundamentais para que as
práticas adotadas no Brasil estejam em linha com o que é considerado de
excelência lá fora.
E temos o que
compartilhar, considerando que vários brasileiros atuaram como palestrantes
neste evento. Há interesse dos estrangeiros em conhecer os detalhes da Operação
Lava Jato, dos impactos nas organizações sancionadas e entender como elas
responderam, além de um contexto legal e de negócios no Brasil por exemplo. E é
interessante perceber que as iniciativas que temos adotado no Brasil estão em
conformidade com as melhores práticas globais, obviamente considerando as
empresas do Brasil com Programas de Compliance maduros.
E neste
aspecto, destaco o primeiro ponto de atenção: ainda temos empresas no Brasil
que não possuem programas de compliance. E dado que a onda de ética e
anticorrupção já é uma realidade, assim como a de privacidade, que é mais
recente, em razão da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, é um
cenário que deve mudar rapidamente nos próximos anos.
Falando em
privacidade, foi interessante perceber que os desafios e problemas que temos
enfrentado hoje no Brasil para a implantação de um Programa de Privacidade e
Proteção de Dados nas organizações não são diferentes do que tem acontecido nos
EUA ou Reino Unido. É global o desafio do profissional de compliance em
convencer os executivos da relevância da onda de privacidade, explicar a
legislação aplicável, seu impacto nos negócios e sua necessidade de
implantação.
Na questão de
uso de serviços terceirizados, ferramentas e softwares também estamos na mesma
página, como por exemplo, na utilização de serviços profissionais e
independentes de canal de denúncia, uso de plataforma e provedores de conteúdo
e-learning, ferramentas de auditoria e de gestão de documentos e afins.
Contudo, a área
de Compliance ainda sofre os reflexos de uma cultura digital em
desenvolvimento, no que tange as soluções como RPA (Robotic Process
Automation), analytics, inteligência artificial, dentre outras tecnologias
disruptivas. Dado que muitas empresas sequer possuem tais iniciativas em suas
linhas de negócio, há obstáculos adicionais a serem superados pelo Compliance
Officer.
Tal cenário não
deve ser fator de desmotivação. Pelo contrário, há oportunidades para o
compliance mostrar dentro das organizações o valor da tecnologia e aplicar
dentro de seus processos. O RPA e o workflow, por exemplo, podem ser úteis para
criar dashboards de forma automatizada, obtendo informações dos diversos
sistemas e ferramentas utilizados, tipicamente de provedores diferentes.
E o primeiro
passo, como comentado no evento, é entender os conceitos e do que se trata cada
solução. O profissional de compliance deve ter a iniciativa de se “alfabetizar”
no mundo digital, assim como se preocupa em aprender inglês ou montar o
conteúdo de um material de treinamento utilizando o Powerpoint.
Temos no Brasil
bons profisisonais de compliance e bons exemplos de Programa. Como citou Daniel
Fridman, ex-procurador do Departamento de Justiça dos EUA, o Brasil conseguiu
em 4 anos fazer o que os EUA precisaram de cerca de 30 anos no que tange à
implantação de políticas anticorrupção e de compliance. Tal prática deve ser
ampliada e ser mais disseminada no País, uma vez que temos ilhas de excelência
que estão alinhadas com o que o mundo tem feito. É o novo jeitinho brasileiro
ao redor do mundo.
*Jefferson
Kiyohara
é
diretor de Compliance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para
gestão de riscos, compliance, auditoria interna, investigação, proteção e
privacidade de dados, única empresa de consultoria reconhecida como Empresa
Pró-Ética por três anos consecutivos.