O agronegócio vai bem? Então aproveite para refletir e se preparar, pois perdemos o controle de quando uma crise pode chegar
Por
Sérgio Ferreira
Na vida, é muito importante aprender com
os nossos erros, mas aprender com os erros dos outros é melhor. Tenho me
lembrado muito deste sábio conselho nos últimos tempos, sobretudo quando penso
neste momento atual do agronegócio. Quais reflexões podemos tirar desta crise
que afeta toda a economia nacional?
De certo, o setor vai precisar de muita
disciplina para fazer esta reflexão, pois o contexto não ajuda: enquanto alguns
estudos sugerem uma retração de 10% do PIB brasileiro em 2020, o PIB
agropecuário deve crescer 2,4% de acordo com o IPEA. Nada mal. Cito o caso da
soja: nos últimos dias, com o câmbio batendo acima dos R$ 5,30, a soja nacional
ganhou ainda mais competitividade e os preços bateram recordes, ultrapassando
R$ 110 a saca. Céu de brigadeiro!
Por que, então, é bom parar para
refletir ao invés de comemorar frente a este cenário tão favorável do
agronegócio? Defendo que é justamente nesta hora que precisamos aprender com os
erros dos outros e nos blindarmos para as situações difíceis que certamente o
setor enfrentará no futuro. Todos conhecemos a natureza cíclica do mercado
agrícola. Então, listei cinco temas para reflexão diante desta crise:
- Caixa e crédito
Se alguém ainda tinha dúvidas, o caixa
realmente é o rei. Justamente para financiar o crescimento e, nos momentos de
crise ou retração na demanda e nos lucros, ele se torna ainda mais fundamental
por ser uma “reserva técnica”. Lembre-se: tentar empréstimos e financiamentos
quando já não há mais caixa e o endividamento é alto significa uma estratégia
arriscada.
Pensando que a crise será difícil a
todos, para aqueles que a iniciaram com uma situação de caixa mais equilibrada,
os efeitos serão menores. Então, não seria este o momento ideal para antecipar
o pagamento de empréstimos e financiamentos? Quais ações estão sendo tomadas
para preservar o caixa agora e no futuro? A gestão do negócio tem objetivado a
geração de caixa?
- Retenção de lucros
Há um dilema histórico e muito comum
entre os empresários: quanto do lucro do meu negócio devo retirar para mim e
quanto devo reinvestir no negócio (retenção)? Sabendo da natureza cíclica do
agronegócio, é preciso refletir que safras mais difíceis virão nos próximos
anos antes de termos novamente essas ótimas. Pensando nisso, não seria este o
melhor momento para investir em tecnologia e em armazenamento, visando aumentar
a eficiência das operações? Quanto deveríamos reter em caixa para evitarmos a
necessidade de endividamento na próxima queda do mercado?
- Diversificação
É preciso focar em três pilares: geração
de caixa, aumento do valor da empresa e gestão (leia-se minimização) de riscos.
Um dos problemas comerciais que encontro com frequência é a concentração
exagerada, que pode ocorrer com a grande dependência de um ou de um grupo de
clientes, com a venda de um produto ou serviço específico ou ainda quando há
concentração de um modelo de negócio específico.
Ao passo do inesperado ocorrido com a
pandemia, que afetou sem precedentes diversos setores, o que aconteceria no
caso do surgimento de uma praga ainda desconhecida com potencial de trazer
sérios prejuízos em algumas safras? Como proceder diante deste cenário?
Pense que este é o momento oportuno para
refletir sobre como diminuir o risco do negócio através de uma maior
diversificação. Que tal montar uma pedreira em parte da terra que não está
sendo utilizada ou fazer um centro de turismo dentro da propriedade, sendo
própria ou terceirizada?
- Redução de custos e
despesas. A importância dos investimentos
Gosto muito da frase “custo é como unha,
tem quer cortar sempre”. No início da crise do Coronavírus, quando ninguém
sabia ao certo a dimensão que ela tomaria, todos focaram na redução de custos e
despesas. Foi interessante notar que gastos “impossíveis” de serem eliminadas
ou reduzidas foram sumariamente cortadas nos últimos dias.
Sabemos que no agronegócio a redução dos
custos passa com frequência por um uso cada vez maior da tecnologia: menos
despesa e mercadorias de melhor qualidade. Sendo assim, já se perguntou quanto
do lucro desta safra será direcionado para investimentos visando a redução
futura de despesas, assim como para melhoria da eficiência operacional?
- Planejamento
Iniciamos o ano em um ambiente de
relativo otimismo, na expectativa de que teríamos um crescimento e, em poucos
meses, o Coronavírus mudou radicalmente o cenário mundial e o brasileiro,
inclusive. Nesta hora, alguém poderia questionar a validade de um planejamento
de longo prazo. Afinal, partindo de uma visão um pouquinho míope, “para que
gastar tempo planejando, já que as coisas mudam o tempo todo?”. A minha
resposta é: justamente porque as coisas sofrem alterações a todo momento,
que é fundamental nos dedicarmos ao planejamento do futuro dos negócios.
Seguramente quem se preparou, mesmo não
prevendo os impactos do Coronavírus, está sofrendo menos os efeitos desta
crise. Porém, quem não planejou quando os ventos ainda estavam favoráveis,
agora está apagando incêndios e lutando pela sobrevivência dos seus negócios.
E você? Já pensou no seu plano de
sucessão, no seu planejamento tributário, e na sua gestão de riscos? E na
expansão e melhoria do seu negócio? Para quem ainda não deu início à essa
reflexão, faça! Antes tarde do que nunca, porque depois do impacto do Covid-19
em escala mundial, temos certeza de que, daqui por diante, não saberemos quando
uma crise pode chegar e qual sua dimensão.
Sérgio
Ferreira é consultor focado em gestão com resultados e conselheiro formado pelo
IBGC