por Eduardo Masulo*
Quando falamos em medo, logo pensamos em um
sentimento comum vivido por milhares de vítimas da violência. Porém, quero
apresentar uma face do medo que está oculta, ignorada, mas ainda assim é um
indutor da violência e alimenta um ciclo benéfico para o crime organizado.
O medo se tornou uma epidemia e o maior aliado
das organizações criminosas da ‘cidade maravilhosa’ para expansão de seus
negócios e territórios, pois, por meio dele, os mais vulneráveis se tornaram
reféns de uma política do "não sei" ou "não conheço".
Essas expressões são usadas em regiões que estão
sob domínio de facções criminosas onde a lei do silêncio predomina, tornando-se
obstáculos para a elucidação e prevenção de crimes. Cerca de 3,7 milhões
cidadãos fluminenses vivem em territórios dominados por grupos paramilitares ou
facções criminosas, segundo o convênio entre Grupo de Estudos dos Novos
Ilegalismos (GENI) da UFF, o Datalab Fogo Cruzado, o Núcleo de Estudos da
Violência (NEV) da USP, a plataforma digital News e o Disque-Denúncia. Esse
número representa 57,5% ou 1/3 da população do Rio de Janeiro, que está sob
regras do poder paralelo, fator que contribui na escalada do medo.
Ao mesmo tempo, é fato que os criminosos da
década de 80 corriam quando observavam a aproximação da famosa "joaninha",
como era chamado o Fusca da Polícia Militar e temiam a Patamo, veículo
utilizado como força repressora da época. Hoje, entretanto, perderam o medo e
enfrentam as Forças de Segurança Pública com estratégias e armamentos de alto
poder de destruição.
Nos dias atuais, o poder paralelo impõe regras e
limita o acesso em seus territórios, criando dificuldades para o policiamento
ostensivo conhecido como “Caveirões”, que deixam de estar presente no cotidiano
de muitas comunidades e permitem o ciclo do terror.
A falta de medo dos marginais, por outro lado,
tem relação com a impunidade, haja vista que o Poder Judiciário, devido à
superlotação dos presídios, tem adotado como medida alternativa a aplicação de
tornozeleiras eletrônicas em condenados por crimes que não sejam contra a vida.
Mas será essa a solução? É fato que os contemplados com tornozeleiras retornam
para o crime e fortalecem um exército estimado em 56 mil criminosos
distribuídos em mais de 1,5 mil comunidades cariocas, número superior ao efetivo
da Polícia Militar do Rio de Janeiro, segundo o Diário do Poder.
Pelo lado dos agentes de segurança, o medo faz
parte de seus cotidianos, com riscos de efeitos colaterais ao acessar uma
comunidade, como ficar refém dos traficantes, da mídia, do poder judiciário em
audiência de custódia, entre outros medos que os assombram.
Mas é fato que não podemos conviver com isso. O
medo impede o nosso desenvolvimento, impulsiona a violência, paralisa pessoas
de bem, trava ações de agentes de segurança e alimenta um ciclo do mal. Temos a
obrigação de utilizar os canais de denúncia, que permitem o anonimato em razão
da preservação da própria integridade para contribuir com o Poder Público em
prol de dias melhores. Quando optamos em ficar calados, contribuímos inversamente
para o aumento do mal.
*Eduardo Masulo é Consultor Sênior na ICTS
Security, consultoria e gerenciamento de operações em segurança, de origem
israelense