por Filipe Monteiro*
Nos últimos anos, a atividade de auditoria interna tem sido
questionada. A dúvida que persiste é se ela realmente agrega valor e não é só
uma burocracia e uma despesa no fim do ano. Somado a isso, outra grande
dificuldade é a auditoria interna conseguir mensurar de forma efetiva seu
sucesso e o retorno de suas atividades para as companhias.
No
cenário atual, conforme as práticas internacionais, a auditoria interna deve
ser baseada em riscos para ser efetiva e auxiliar a companhia no atingimento de
seus objetivos estratégicos. Outro viés importante da auditoria é o apoio ao
compliance nas chamadas auditorias especiais derivadas de denúncias, ou
avaliações independentes quanto à aderência da companhia a regulações como a
LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) ou quanto a normas e políticas internas,
como a de suprimentos e gestão de terceiros.
Uma
nova visão e atribuição para a auditoria interna, que aparece como grande
oportunidade para mostrar seu valor e conquistar de vez uma posição de destaque
dentro das companhias, é a auditoria integrada. Este conceito surge a partir do
modelo de pensamento integrado da Value Reporting Foundation, que representa
hoje a maior esperança de um framework consolidado de apresentação de
informações financeiras e pré-financeiras, entre elas questões como o ESG
(Environmental, Social and Governance).
Neste
modelo de pensamento integrado, a ideia é fugir um pouco da visão apenas
interna da empresa e da mitigação de riscos para o atingimento da estratégia. A
lógica por trás do pensamento integrado é levar em consideração a conectividade
e as interdependências entre uma gama de fatores que afetam a capacidade de uma
organização de gerar valor ao longo do tempo.
Dentro
desse conceito, incluem-se os capitais utilizados ou afetados pela organização,
bem como as interdependências críticas, inclusive as compensações entre elas; a
capacidade da organização de atender aos legítimos interesses e necessidades
das principais partes interessadas; a adequação da organização ao seu modelo de
negócios e de sua estratégia ao seu ambiente externo e aos riscos e às
oportunidades enfrentados e as atividades; o desempenho financeiro ou
pré-financeiro e os impactos de uma organização em termos dos capitais –
passados, presentes e futuros.
O
pensamento integrado, desta maneira, busca garantir a sustentabilidade de uma
empresa ao longo do tempo apoiado na geração de valor, que irá derivar de sua
adequada utilização dos capitais financeiro, tais como aplicações, caixa,
empréstimos; manufaturado, como máquinas, imóveis, estoques – exceto naturais;
intelectual, ou seja, patentes, licenças, softwares; humano, a exemplo de
competências e habilidades das pessoas; social, que inclui o relacionamento com
as partes interessadas, marca e reputação; e natural, como água, energia,
biodiversidade.
Em
uma sociedade na qual os ativos intangíveis representam cerca de 80% do valor
das empresas, inversamente proporcional à realidade dos anos 70, não faz mais
sentido que a auditoria direcione todos os seus esforços para as questões
financeiras e operacionais. Precisa haver uma atualização de conceito. Em
paralelo com o crescimento do conceito do capitalismo de stakeholders, é hora
de a auditoria gerar informações para o board de maneira independente,
contemplando diversos temas relevantes aos principais stakeholders da empresa e
antecipando a perda de valor ou demonstrando oportunidades de geração de valor.
Para
tornar possível esta nova visão e função da auditoria interna dentro das
empresas é fundamental uma mudança de mentalidade. Em primeiro lugar, o perfil
dos auditores internos terá que ser cada vez mais empreendedor, com visão de
negócios, inovador e orientado ao futuro e com conhecimentos múltiplos para
realizar interface com diversas áreas dentro das organizações, além de
proporcionar uma visão independente sobre como os recursos e capitais dentro de
uma organização estão sendo geridos e utilizados.
Outra
consideração fundamental é a necessidade de digitalização da auditoria interna
e o suporte da tecnologia por meio de ferramentas para que seja possível à
auditoria pensar em oportunidades sem desistir de avaliar os riscos, ou seja,
pensar no apoio ao ataque para “fazer o gol” sem deixar de resguardar a defesa.
O resultado favorável se dá por fazer mais gols do que tomar. Neste quesito, a
automação de controles, o monitoramento contínuo, a utilização de robôs e
sistemas de GRC (Governança, Gestão de riscos e Compliance) são obrigatórios
para que a auditoria mantenha sua função sendo realizada da forma adequada e
ainda tenha tempo para a avaliação de fatores externos - percepção de
stakeholders e mega tendências – com um olhar para o futuro.
A
auditoria interna vem se aprimorando ao longo do tempo. No início se limitava a
olhar para o passado e apontar o que ocorreu de errado. Em um segundo momento,
passou a mitigar a materialização de eventos de risco negativos utilizando
ferramentas tecnológicas como apoio. Por fim, chega o momento de olhar para
frente, auxiliar o board na tomada de decisão futura, permitindo ajustes de
rota de maneira planejada e antecipada, já visualizando as tendências para
garantir a perenidade e a sustentabilidade ao longo do tempo por meio da
geração de valor, tanto para os shareholders, como também para os
stakeholders.
*Filipe
Monteiro é gerente na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para
gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação, proteção e
privacidade de dados.